Os acontecimentos desse dia 11 de Março são sobejamente conhecidos: o ataque aéreo ao Regimento de Artilharia Ligeira nº 1 (levado acabo cerca das 11h45 por aviões da Base Aérea n.º 3), o cerco das tropas paraquedistas do Regimento de Caçadores Paraquedistas de Tancos ao Regimento de Artilharia Ligeira nº 1, a prisão do comandante-geral e outros oficiais da Guarda Nacional Republicana no Quartel do Carmo, as tentativas de Spínola de aliciar Jaime Neves, Almeida Bruno e outros a aderirem ao golpe, os apelos à mobilização popular da Intersindical, a organização de piquetes de trabalhadores junto de alguns Bancos e à Emissora Nacional, o ataque ao Rádio Clube Português em Porto Alto, etc.

 

  

Ao princípio da tarde a derrota de Spínola e dos seus apoiantes era evidente. Ao sentir que o golpe falhara, ao ver que a Escola Prática de Cavalaria não tinha saído, que os fuzileiros não intervinham, que o Regimento de Artilharia Ligeira nº 1 não fora tomado e que mesmo os revoltosos do Carmo se tinham rendido, Spínola foi aconselhado a retirar-se. Num momento em que grande parte do pessoal da Base Aérea 3 se amotinava, Spínola e 15 oficiais escaparam, de helicóptero, para a base aérea de Talavera La Real em Badajoz, Espanha. Em Lisboa, realizam-se manifestações de condenação do golpe convocadas pelo PCP, PS, MES, FSP, MDP/CDE (no Campo Pequeno), MRPP e UDP (no Carmo).

Em relação a estes acontecimentos, importa tentar perceber as suas motivações e enunciar as suas consequências. Em primeiro lugar, as nacionalizações e a imediata institucionalização do MFA consubstanciada na criação do Conselho da Revolução. Depois, a recomposição governamental, que se traduz na constituição de um novo executivo com vários elementos afetos ao primeiro-ministro Vasco Gonçalves. Foi ainda neste clima que se deu um salto qualitativo no processo revolucionário e que se reiniciaram as conversações MFA-Partidos tendo em vista a celebração de uma Plataforma de Acordo Constitucional. Finalmente, apesar da oposição dos setores mais radicais, a garantia da realização das primeiras eleições, em 25 de Abril, passo fundamental para a génese da democracia portuguesa.

Podemos dizer que, com o 11 de Março, as forças políticas e sociais que haviam constituído a base de apoio do general Spínola, agora com suporte interno mais alargado, que incluía grupos económicos e sociais que se sentiam ameaçados com os desenvolvimentos do processo político (especialmente pela crescente participação popular, pela influência dos militares do MFA considerados esquerdistas, e pela participação do Partido Comunista), contando com o apoio em Espanha de setores significativos do regime franquista, tentaram levar de novo Spínola ao poder e reverter a situação política portuguesa. Queriam expurgá-la tanto da participação popular fora dos aparelhos políticos institucionais, acusando-a de anarquia e caos, como das anteriores medidas de redistribuição da riqueza, consideradas de inspiração comunista, assim como influenciar a última fase da descolonização, em particular de Angola.

Os acontecimentos do 11 de março e os que se seguiram durante o PREC até ao 25 de novembro de 1975 são o reflexo da diversidade dos projetos político nascidos, na sua maior parte, na oposição ao Estado Novo e também das contradições que já eram patentes desde o primeiro governo provisório, organizado tendo por base personalidades da oposição democrática tão diversas como as que procediam do MDP e das Comissões Democráticas Eleitorais; do Partido Socialista criado na Alemanha em 1973, herdeiro de uma longa tradição de luta e de resistência de organizações anteriores, mas sem uma significativa implantação no interior do país; do Partido Comunista Português, que assumira ao longo dos anos uma atitude frontal de combate ao fascismo e defendia um tipo de sociedade cujo modelo era a União Soviética; e também de um grupo de personalidades que haviam integrado a ala liberal da Assembleia Nacional.

Os militares, pelo seu lado, de acordo com o Programa do MFA, tinham limitado a sua participação política através da Junta de Salvação Nacional e do Conselho de Estado, mas foram alargando a sua ação, ora reclamados para a resolução de todo o tipo de conflitos do quotidiano, ora assumindo papéis ativos na condução política do processo.

Aniceto Afonso
Carlos Matos Gomes
Maria Inácia Rezola

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